quarta-feira, 24 de julho de 2013

Os 5 sentidos!...

(imagens retiradas da internet)




Alimentar os afectos ou os sentidos?

Uma grande parte das decisões que tomamos diariamente sobre comida não tem nada a ver com a satisfação de necessidades energéticas. O que é que aquilo que você come diz sobre o seu estado emocional?

Diz o mais recente “estado da arte” científico que em termos de escolha alimentar tomamos mais de 200 decisões diárias. O que comer? Quando comer? Em que quantidade? Com quem? Onde? E a lista continuaria. Trata-se de um número que em muito ultrapassa a simples gestão de necessidades fisiológicas. Longe de ser um mero exercício de resposta a uma baixa energética ou fruto de um planeamento racional, consciente e totalmente deliberado “do que” e “quanto” comer, como tantas receitas milagrosas para emagrecer parecem fazer crer, a regulação dos nossos actos alimentares é influenciada por muitos outros factores internos e externos. O que pretendemos realmente alimentar com cada acto de ingestão? Que influências podem juntar "a fome à vontade de comer"?

Alimentamos os nossos sentidos sempre que as influências externas e o apelo inconsciente que muitas vezes lhes é feito (o aspecto e o cheiro, por exemplo) levam ao consumo automático. Não é novidade que vivemos num meio ambiente alimentar que nos predispõe para uma alimentação oportunista. Este meio alimentar tóxico é caracterizado pela exposição a alimentos de elevada densidade energética e palatibilidade a preços acessíveis (já reparou que um bolo é bem mais barato que uma sandes?!). Esta forte estimulação sensorial pode tornar algumas pessoas mais susceptíveis à sobrealimentação (i.e. comer em grandes quantidades).

Todos conhecemos pessoas a quem chamamos gulosas. Pessoas com tendência para uma forte procura de alimentos (“Já se comia alguma coisa!”), capacidade para grande ingestão, acentuada resposta hedónica (“está meeeeesmo bom”!) e mecanismos de saciedade reduzidos (estão sempre com fome e a pensar em comer). Serão gulosas ou, pelo contrário, possuem características antes evolutivas, num meio ancestral com acesso incerto a alimentos, mas que hoje perderam a sua vantagem acabando por configurar a expressão de um “genótipo obesogénico”? Seja como for, a verdade é que para estas pessoas é (compreensivelmente) mais difícil regular a sua ingestão e as questões da estimulação sensorial, altamente sugestionáveis pelo meio alimentar tóxico, oferecem um risco acrescido a ter em conta. Alimentamos os nossos afectos sempre que usamos (consciente ou inconsciente) a comida como reguladora dos estados emocionais. Claro que é importante reconhecer que a comida tem componentes que afectam a forma como nos sentimos - comer alimentos muito densos energeticamente em açúcar ou em gordura, por exemplo, provoca respostas positivas que ditam por eles uma apetência aumentada. Nesse sentido é compreensível que situações de maior fragilidade interior ditem uma maior procura de gratificação exterior, nomeadamente através da comida. Mas facilmente se percebe que esta é uma situação falível.

Esta questão pode assumir ainda contornos menos conhecidos. Tendemos a pensar nesta “alimentação emocional” principalmente na presença de emoções negativas (tristeza, angústia, ansiedade, irritação), mas o problema pode não se prender só com a dificuldade em lidar com as emoções negativas e também com a sua correcta identificação. Algumas pessoas parecem ter mais dificuldade em identificar, reconhecer e descrever estados emocionais, interpretando qualquer desconforto interno como pertencendo ao foro fisiológico, nomeadamente como fome. Para estas pessoas é muito difícil sentirem-se de outra forma que não passe pela comida (”estar vazio… ou cheio!”). Mais do que apontar o dedo, tentar controlar ou chamar estas pessoas de “gulosas” e “descontroladas” seria importante considerar a importância de se pensar no desenvolvimento de “ambientes afectivos salutogénicos” onde, desde tenra idade, as crianças fossem encorajadas a identificar estados emocionais em si e nos outros criando uma espécie de “literacia emocional” fundamental.

Por outro lado importa sublinhar que gostar de comer ou procurar algum conforto nos alimentos em situações mais difíceis não tem que conter em si problemas de maior. A comida é um estímulo positivo em todo o reino animal! Não obstante, convém dedicar alguma reflexão a sinais como o grau em que isso acontece (a frequência e intensidade da ingestão ou simplesmente se é um bombom ou a caixa toda), a presença ou não de culpa posterior (retirei realmente prazer daquele acto de ingestão ou fui assaltado por sentimentos destrutivos de culpa?), comprometimento da vida quotidiana (escondo-me para comer porque não quero que reparem no que faço?) e, por último, o automatismo (é uma procura deliberada ou nem me apercebo dela e o pacote de bolachas desaparece sem dar por isso).


Alimento para a nossa reflexão?


Marlene Nunes Silva 
Psicóloga Clínica e Investigadora
Faculdade de Motricidade Humana, Universidade Técnica de Lisboa


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